Contrato com a OS Santa Casa de Birigui, no valor de quase R$ 1 milhão, foi feito por dispensa de licitação no início da pandemia; ex-prefeito rebate decisão e diz que sua defesa está elaborando recursos pertinentes
O contrato para prestação de serviços de atendimento a casos suspeitos de covid-19, urgências e emergências no Pronto-Socorro “Dr. Alceu Lot” foi assinado no dia 22 de abril de 2020, início da pandemia do novo coronavírus, no valor de R$ 975.587,30, pelo período de três meses. A multa estabelecida é de 300 Ufesps (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo), o equivalente a R$ 8.727,00 para cada um.
No acórdão, os conselheiros Dimas Ramalho e Renato Martins Costa acompanharam o voto do conselheiro-substituto Samy Wurman e acataram a determinação para que o atual prefeito Leandro Maffeis (PSL) instaure procedimento administrativo a fim de apurar as responsabilidades pelas ilegalidades apontadas pela fiscalização do órgão. Também determinaram o encaminhamento do processo ao Ministério Público Estadual para ciência e eventuais providências, pois o convênio “é objeto de investigação no âmbito criminal nas esferas estadual e federal, por suposto desvio de recursos públicos da área da saúde, no âmbito da operação denominada ‘Raio-X’, deflagrada em 2020”.
Conforme decisão do TCE, foram vários os problemas encontrados, tais como dispensa de licitação, ampliação indevida de serviços já previstos em convênio firmado entre as mesmas partes, inexistência de aumento da demanda por atendimentos, pagamento por serviços e insumos em duplicidade, prejuízos ao erário, não justificativa de necessidade da contratação, não realização de pesquisa de preços, entre outros, descumprindo princípios da legalidade e economicidade.
No relatório, o conselheiro do Tribunal destaca, entre outros tópicos, que o contrato previa prestação de serviços para casos suspeitos de covid-19, traumas, infartos e urgências respiratórias que chegariam por meio de resgate ao pronto-socorro, enquanto os atendimentos clínicos de rotina, pediatria e odontológicos, antes realizados no local, seriam deslocados para o “Corujão” (UBS1 – bairro Cidade Jardim), que passou a dar atendimento 24 horas.
No entanto, as justificativas não foram aceitas, pois a fiscalização afirma que os serviços já estavam inclusos no convênio de gestão do PS, “resultando, portanto, em duplo pagamento para o mesmo objeto, sem a devida comprovação do aumento de demanda devido à pandemia, agravado pela clara e severa diminuição da quantidade de atendimentos no pronto-socorro e UBS onde são prestados os serviços”.
Outro problema foi com relação às datas, sendo o início efetivo da prestação dos serviços 15 dias antes da assinatura do contrato, que foi rescindido amigavelmente em 24 de junho do mesmo ano.
A Prefeitura explicou ao TCE-SP que havia necessidade de dar atendimento rápido à população e evitar os riscos de contágio, por isso houve separação de “fluxo”, ficando os casos relacionados à covid no PS e os demais, no “Corujão”.
Sobre a duplicidade de pagamento, afirma que a comissão de acompanhamento e fiscalização faz, de forma minuciosa, a análise das despesas apresentadas pela entidade social, e somente realiza os repasses relativos ao que foi efetivamente realizado.
Destacou que a OS Santa Casa de Birigui é o único hospital credenciado ao SUS no município, celebra convênios com o Poder Público desde a década de 1990 e que a escolha dela “ocorreu por motivos de conveniência e oportunidade, bem como para privilegiar o interesse público, em face da urgência de se intensificar ações voltadas ao combate e à disseminação do novo coronavírus”.
Sobre o início dos trabalhos antes da assinatura do contrato, atribuiu à necessidade de adoção de providências imediatas para tranquilizar a população, onde já estava instalado “um pânico”.
Em sua defesa ao TCE-SP, a Santa Casa de Birigui confirmou a adoção de medidas por parte da Secretaria de Saúde para evitar o cruzamento de pacientes “de rotina” com os que apresentavam sintomas do coronavírus e afirmou que é “indiscutível que as medidas adotadas foram justamente para evitar o aumento da demanda relacionada aos casos de coronavírus”.
Informou que a pandemia gerou a diminuição ou o cancelamento de muitos procedimentos médicos, o que prejudicou o equilíbrio orçamentário de muitas entidades privadas que prestam serviços ao SUS, como hospitais filantrópicos e Santas Casas, e citou a publicação de normas com suspensão de metas quantitativas e qualitativas em contratos e regras excepcionais sobre convênios na área da saúde no período.
“O contexto da pandemia e a forma como ela se alastrou, com curvas exponenciais, não permitiria a realização formal de todo um processo que envolveria qualificação, chamamento público, contratação, e, eventualmente, a construção de um hospital de campanha no município”, defendeu.
Questionado sobre o acórdão, o ex-prefeito Cristiano Salmeirão disse que ficou surpreso com a decisão, uma vez que, no mérito, a mesma diz não ter sido necessária em pleno auge da pandemia a contratação de serviços para atendimento em separado de pacientes acometidos de covid-19 dos demais, informando que tal segregação de pacientes e de fluxo é a orientação do Ministério da Saúde.
Segundo o ex-prefeito, com a implantação do Corujão em 2020, com atendimento 24 horas, foram separadas as pessoas sem covid-19 e que precisavam de atendimento. Aquelas que tinham sintomas passaram a ser atendidas no pronto-socorro, onde foram colocadas tendas. Dessa maneira, conseguiu-se estabilizar a pandemia, infelizmente com a morte de 118 pessoas
“O atual prefeito aumenta em quase R$ 1 milhão mensal o pagamento pelo serviço e até o momento, infelizmente, faleceram mais de 612 pessoas em 2021, ou seja, mais de 400% de mortes no mesmo período, e para o Tribunal de Contas está tudo certo?”, indagou. “Políticas externas estão atuando para me prejudicar, mas a população é testemunha que em 2020 este serviço esteve à disposição e, inclusive, foi fiscalizado por vereadores à época, aprovado pelos conselhos e noticiado pela imprensa”, disse.
Salmeirão esclareceu ainda que a citação da “Operação Raio-X” pelo Tribunal de Contas é abusiva, uma vez que esta não só foi precedente ao contrato, como não tem absolutamente nada a ver com o mesmo.
Por fim, disse que houve um erro grosseiro, uma vez que foram julgados dois processos em conjunto e em um sequer houve a oportunização de defesa a ele, sendo nula a decisão por este motivo e que sua defesa já está elaborando os recursos pertinentes.
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